Evolução da Inteligência Artificial: o Deep Learning e a praticidade

O método que reduz a participação humana no treinamento de dados tem ganhado cada vez mais espaço no mercado

O campo da Inteligência Artificial (IA) está em constante evolução. Um dos avanços mais recentes é o Aprendizado Profundo (ou Deep Learning), um método de Machine Learning. Esse método inovador ensina computadores a processarem dados de forma inspirada no funcionamento do cérebro humano, permitindo a resolução de problemas complexos e a criação de novos recursos de forma autônoma.

A eficiência do Aprendizado Profundo vem do uso de redes neurais artificiais, compostas por camadas interconectadas de neurônios que simulam o funcionamento das redes neurais do nosso cérebro. Diferente do aprendizado de máquina tradicional, que depende da seleção de características de forma manual de dados para o treinamento, o Deep Learning  extrai características dos dados  de forma automática, por meio de um processo de treinamento para ajuste dos pesos entre as conexões existentes entre os neurônios..

As camadas no Deep Learning

As redes neurais profundas são compostas por diversas camadas, que funcionam em conjunto para aprender e processar informações. Cada camada tem um papel específico:

  • Camada de entrada: é responsável por receber os dados brutos (imagem, som, texto, etc.) e repassá-los para as camadas seguintes;
  • Camadas ocultas: cada camada oculta extrai e transforma diferentes características  dos dados, analisando a informação de maneira mais geral  à análise feita pelo último nível. Por exemplo, ao identificar uma imagem de um animal, uma camada pode detectar bordas, outra formas, outras texturas, e assim por diante, até chegar à identificação final;
  • Camada de saída: fornece o resultado  do processamento, como uma classificação, uma decisão ou uma resposta gerada para uma nova entrada apresentada.

Cada nó (ou neurônio) dentro de uma camada realiza operações simples (como multiplicação, adição e cálculo de função) e transmite os dados adiante. Esse fluxo é o que permite à rede aprender com eficiência crescente, camada após camada. A Rede Neural Convolucional (CNN) é um dos modelos mais conhecidos de Deep Learning. Ela consiste em uma arquitetura de rede neural de retroalimentação (feedforward) especializada na extração automática de características de dados com padrões convolucionais, dispensando a necessidade de métodos manuais de extração de características. 

Inspirada no funcionamento do sistema visual biológico, a CNN utiliza neurônios artificiais que simulam neurônios reais, kernels que atuam como detectores de características específicas e funções de ativação que replicam a transmissão de sinais neurais acima de um determinado limiar. Sua estrutura é composta por camadas de convolução, responsáveis por gerar mapas de características; camadas de pooling, que reduzem a dimensionalidade dos dados mantendo as informações essenciais e eliminando redundâncias; e fully connected layers (FC), que mapeiam as características extraídas para uma determinada saída, como classificação.

A imagem acima demonstra como as redes CNNs funcionam | Foto: Reprodução

Tipos de modelos de Deep Learning

  • Redes Neurais Convolucionais (CNNs ou ConvNets): muito utilizadas em visão computacional, reconhecem padrões em imagens e vídeos. São fundamentais em tarefas como detecção de objetos e reconhecimento facial.
  • Redes Neurais Recorrentes (RNNs): processam dados como texto e fala. São amplamente usadas em aplicações de linguagem natural e previsão de séries temporais.
  • Autoencoders e VAEs: codificam e decodificam dados, com destaque para geração de conteúdo e compressão de dados. Os autoencoders variacionais foram a base para o desenvolvimento de IAs generativas.
  • Redes Adversárias Generativas (GANs): geram dados realistas (como imagens, vídeos ou áudios) ao colocar dois modelos (gerador e discriminador) em competição. Muito usadas em criação de imagens sintéticas e deepfakes.
  • Modelos de Difusão: geram imagens a partir de ruído aleatório, oferecendo resultados realistas com mais estabilidade de treinamento que os modelos GANs, embora demandem alto poder computacional.
  • Transformers: revolucionaram o processamento de linguagem natural (NLP), com arquiteturas codificador-decodificador e treinamento paralelo. São a base de modelos como BERT e GPT.
O Aprendizado Profundo faz parte, de maneira imperceptível, do cotidiano das pessoas | Foto: Envato

Vantagens do Deep Learning

A professora Roseli Romero, vice-coordenadora do MBA em Inteligência Artificial e Big Data da USP, destaca a facilidade e a autonomia oferecidas por esse método, que beneficia diretamente seus usuários. Entre as principais qualidades encontram-se:

  • As redes neurais profundas são aproximadores universais, isto é, conseguem aproximar qualquer função não linear. Por esse motivo, elas são muito apropriadas para resolver problemas de classificação de padrões e predição de dados.
  • Capacidade de análise de dados não estruturados: imagens, textos e sons, como os provenientes de redes sociais e vídeos.
  • Rotulagem automática após o treinamento inicial.
  • Economia de tempo, ao reduzir a necessidade de intervenção humana constante.

Aplicações práticas

O Deep Learning já está presente no cotidiano, mesmo que de forma imperceptível. Ele atua em diversas áreas, como:

  • Visão computacional: reconhecimento facial, classificação de imagens, visão robótica.
  • Processamento de linguagem natural: tradução automática, chatbots, análise de sentimentos.
  • Reconhecimento de fala: assistentes virtuais, transcrição de áudio.
  • Robótica: controle de movimentos e navegação autônoma.
  • Finanças: detecção de fraudes, análise de risco, negociações automatizadas.
  • Saúde: diagnósticos, descoberta de medicamentos, medicina personalizada.

Desafios e obstáculos

Apesar dos avanços, o Aprendizado Profundo ainda enfrenta pequenos entraves:

  • Caixa-preta: os modelos são difíceis de interpretar, o que limita a compreensão de como chegaram a determinados resultados.
  • Alto custo computacional: exige grande capacidade de processamento, o que pode ser mitigado por serviços como Google Cloud (GCP) ou Amazon Web Services (AWS).
  • Dependência de grandes volumes de dados: quanto mais dados, maior a precisão, mas também maiores os desafios em relação à privacidade e ao viés.
  • Treinamento complexo: a criação e ajuste dos modelos requerem conhecimento técnico, mas existe muito material disponível para ser consultado. 

Mesmo assim, este modelo não parará de avançar e, para a professora Roseli, as tendências futuras são os modelos cada vez mais versáteis, que trabalhem com diferentes formatos de dados simultaneamente e que se assemelhe mais ao comportamento dos humanos, ao focar em mais de um estímulo ao mesmo tempo. “Eu vejo que os sistemas, que forem capazes de lidar com todos esses estímulos ao nosso redor, serão os mais próximos do que chamamos de inteligência artificial”, finaliza Roseli. 

Texto: Letícia Reis, da Fontes Comunicação Científica