Era o verão de 1955 em Hanover, uma pequena cidade do estado de New Hampshire, nos Estados Unidos, quando um grupo de cientistas se reuniu em torno de um sonho um tanto improvável para a época: fazer com que máquinas pudessem pensar. Entre eles estava um jovem matemático de apenas 28 anos, John McCarthy, que, sem imaginar, acabaria mudando o rumo da ciência e da tecnologia moderna.
McCarthy acreditava que a inteligência humana poderia ser descrita com tamanha precisão que seria possível simulá-la em um computador. Essa convicção levou-o a redigir, junto com Marvin Minsky (Harvard), Claude Shannon (Bell Labs) e Nathaniel Rochester (IBM), uma proposta de pesquisa de apenas 14 páginas. O documento, enviado à Fundação Rockefeller, trazia um título que inauguraria uma nova era: A Proposal for the Dartmouth Summer Research Project on Artificial Intelligence, a primeira vez que alguém usava a expressão inteligência artificial (IA).
“Partimos da conjectura de que cada aspecto da aprendizagem ou de qualquer outra característica da inteligência pode ser descrito de forma tão precisa que uma máquina pode ser feita para simulá-lo”, dizia o texto do projeto, feito em uma época em que os computadores ocupavam salas inteiras e faziam apenas cálculos simples. Ainda assim, McCarthy e seus colegas acreditavam que poderiam ensinar as máquinas a usar a linguagem, formar conceitos, resolver problemas e até melhorar a si mesmas.
O encontro, realizado em 1956, ficou conhecido como Conferência de Dartmouth e é considerado o marco fundador da IA como disciplina científica. Reuniu nomes que se tornariam gigantes da área e lançou as bases teóricas para tudo o que viria depois, dos chatbots aos sistemas generativos que vêm transformando o trabalho e a vida das pessoas.
Para a professora do Instituto de Ciências Matemáticas e Computação (ICMC-USP) e coordenadora do MBA em IA e Big Data da USP, Solange Rezende, John McCarthy foi um visionário que enxergou muito além do seu tempo: “John McCarthy não só criou o termo inteligência artificial, mas abriu caminho para que pudéssemos investigar como o pensamento humano pode ser representado matematicamente e transformado em sistemas computacionais capazes de aprender, decidir e criar. Seu legado é a base sobre a qual todo o nosso avanço atual se sustenta”.

Nos anos que se seguiram à Conferência de Dartmouth, McCarthy não parou mais. Criou a linguagem de programação LISP (List Processing), fundamental para as primeiras gerações da IA simbólica. Desenvolveu o conceito de time-sharing, que permitiu que várias pessoas usassem o mesmo computador simultaneamente, um passo decisivo rumo ao que mais tarde seria chamado de computação em nuvem. E lutou para que a IA fosse tratada como ciência, e não como ficção.
Apesar da desconfiança da época, McCarthy manteve firme sua convicção. Décadas depois, resumiria sua visão de forma quase profética: “O problema central da inteligência artificial é fazer com que máquinas se comportem de forma que possamos chamá-las de inteligentes”.
Setenta anos se passaram e a aposta de McCarthy e seus colegas parece ter se cumprido em proporções que talvez nem eles imaginassem. Modelos de linguagem, aprendizado profundo e sistemas generativos capazes de criar texto, imagem, música e código são, hoje, o coração da transformação digital.
Para Solange Oliveira Rezende, entender essa origem é essencial para entender o presente e projetar ações futuras.. “Ao olhar para trás, percebemos que muitos dos desafios apontados por McCarthy continuam como objeto de estudo: a linguagem natural, a abstração, o aprendizado. Suas perguntas seguem inspirando as novas gerações de cientistas e profissionais”, acredita.

Um legado que atravessa gerações
McCarthy construiu sua carreira na Universidade de Stanford e recebeu muitas condecorações, entre elas o Prêmio Turing em 1971, o maior reconhecimento da ciência da computação. Ele faleceu em 2011, aos 84 anos e sua herança vai muito além das premiações, estando presente nas universidades, nas empresas de tecnologia e no cotidiano de milhões de pessoas que interagem com sistemas inteligentes diariamente.
É justamente esse o espólio de McCarthy que inspira o MBA em Inteligência Artificial e Big Data do ICMC-USP: formar profissionais capazes de imaginar e construir o próximo capítulo dessa história.
Matéria: Gabriele Maciel, da Fontes Comunicação Científica
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